STF reafirma que ISS sobre contratos de franquia é constitucional: o que muda na prática

Decisão foi tomada em 2020, mas Supremo analisou e rejeitou recurso na última semana. Setor estima que incidência de tributos possa ter consequências também para franqueados

Há pouco mais de um ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, pela maioria dos votos, que a incidência de Imposto Sobre Serviços (ISS) sobre royalties em contratos de franquia é constitucional. Dessa forma, as franqueadoras passaram a ter de recolher impostos adicionais, que variam de 2% a 5%, de acordo com cada município. A Associação Brasileira de Franchising (ABF) apresentou recurso, que foi novamente rejeitado na última semana, em sessão virtual.

Finanças: marcas precisarão rever custos e estratégias de expansão (Foto: Mikhail Nilov / Pexels)

O assunto já era discutido havia anos, e as marcas ganhavam na Justiça o direito de não serem cobradas, com amparo no impasse jurídico. A decisão do STF, no entanto, derrubou as liminares e ainda permitiu que alguns pagamentos sejam cobrados de forma retroativa.

“Agora, há uma variedade de situações em relação aos pagamentos retroativos. Há redes que já vinham pagando esse tributo regularmente, outras em juízo e algumas tinham provisões para o pagamento”, afirma o diretor jurídico da ABF, Sidnei Amendoeira. Ele também diz que cada rede agora deverá estudar sua própria situação para encontrar o melhor caminho — e adianta que um novo recurso pode ser apresentado.

Com a decisão, o STF entende que a franqueadora é uma prestadora de serviços, por fornecer suporte, treinamento e consultoria, entre outros, aos franqueados e candidatos à franquia. No entanto, a ABF discorda, e afirma que a lei de franquias, reformulada no início de 2020, não prevê isso.

A entidade ainda estima que haverá um aumento considerável na carga tributária das marcas, o que pode até inviabilizar negócios depois de um ano de dificuldades, decorrentes da pandemia. "Um cenário tributário tão incerto — diversos tribunais já haviam reconhecido a não-incidência — certamente espanta investimentos e pode ocasionar fechamentos e reduções de equipe”, afirma o presidente da ABF, André Friedheim.

A decisão

No ano passado, o relator do projeto, ministro Gilmar Mendes, disse que a incidência de ISS sobre contratos de franquia passa pela interpretação do artigo 156, inciso 3º, da Constituição Federal, que atribui a decisão de cobrança do imposto aos municípios, bem como a definição do que é serviço.

De acordo com Mendes, os contratos de franquias são híbridos, pois se comprometem tanto com a obrigação de "dar", como com a de "fazer". "A doutrina costuma separar prestações abarcadas na relação de franquia como ‘atividade-fim’, tais como a cessão do uso de marca, e ‘atividade-meio’, tais como treinamento, orientação, publicidade, etc.", disse o ministro à época.

Amendoeira afirma que, mesmo com o entendimento do STF, a possibilidade de cobrança de impostos retroativos deveria ter sido considerada, com base na jurisprudência, pois gera insegurança jurídica, com "graves consequências econômicas". "Se o STF entendeu que os precedentes anteriores não poderiam mais ser aplicados, que determinasse a superação dos mesmos dali em diante, sem permitir sua aplicação ao passado", pontua.

Consequências para os franqueados

Thaís Kurita, sócia do escritório especializado Novoa Prado Advogados, explica que essa nova despesa, embora deva sair do orçamento da franqueadora, pode acarretar um “repasse indireto” de custos para os franqueados. Revisões de taxas e valores cobrados pela marcas podem acontecer nos próximos meses.

A especialista, no entanto, não acredita que a decisão do STF possa afugentar novos empreendedores interessados no sistema. “Os ganhos trazidos pelo sistema de franquia vão desde a rápida capilarização Brasil afora, até ganhos de volume e escala”, afirma.

Amendoeira afirma que essa tributação pode acabar representando um degrau a mais para quem está em dúvida sobre transformar o próprio negócio em franquia, ou se tornar franqueado de alguma marca. O cálculo de retorno sobre o investimento vai passar a considerar o impacto da decisão.

Corte de custos e revisão na expansão

Para os entrevistados, a decisão fará com que a franqueadora precise cortar ainda mais custos para se manter viável — além dos ajustes que já foram feitos nos últimos 18 meses. É hora de revisar o planejamento financeiro e tributário. Kurita diz que os empreendedores precisam se atentar às oportunidades de aperfeiçoar processos com a ajuda da tecnologia. “É necessário observar o que há para ser otimizado na rede, em vez de cortado.”

Amendoeira ainda sugere que, além de buscar novas receitas, as marcas passem a olhar para municípios com melhores condições de alíquotas e de pagamentos para expansão.