Soluço protecionista
Choque de imposto a fim de proteger montadoras que usam conteúdo nacional é um remendo incapaz de tornar setor mais produtivo
O governo baixou um  impostaço a fim de proteger as montadoras que produzem veículos com um  conteúdo mínimo de peças nacionais ou do Mercosul. A medida tem como  objetivo encarecer produtos importados.
Embora o ritmo de vendas de veículos continue forte, as montadoras  passaram a estocar excessos de produção em seus pátios e a colocar seus  trabalhadores em férias coletivas compulsórias. As empresas tomavam tais  decisões devido ao aumento da importação de veículos, de 40% neste ano,  e ao aperto no crédito.
O governo assumiu que a alta do imposto sobre importados é um modo de  proteger empregos brasileiros da invasão internacional. É inegável que  as empresas nacionais, não só as montadoras, padecem pressões de custos e  competição estrangeira artificial.
A inflação média está alta. O real se valorizou devido às políticas  econômicas excepcionais no mundo rico, e empresas asiáticas se valem do  câmbio desvalorizado de seus países, quando não de práticas desleais de  comércio.
Existe, pois, uma situação extraordinária. Mas onde estão as medidas estruturais, para tornar a indústria mais produtiva?
Na política industrial anunciada pelo governo em agosto, o "Brasil  Maior", estavam previstas reduções de impostos para montadoras, desde  que as empresas se comprometessem com um plano de melhoria e  nacionalização de produtos. As fábricas preferiram pagar impostos em vez  de incrementar suas linhas de produção.
Não se trata de um comportamento inédito do setor, de costume  refratário à competição externa, que vende produtos defasados e já  protegido pelo mais alto imposto de importação.
Apesar das queixas das montadoras, várias delas têm anunciado planos de  ampliar a produção no Brasil. O contraste entre os planos de  investimento e as reclamações suscita outra questão sobre os benefícios  às montadoras. Como se trata de empresas fechadas, o contribuinte pouco  sabe de sua rentabilidade ou de suas despesas em inovação. Sabe pouco a  respeito de quão justas podem ser as reivindicações das empresas.
Não se pode estar certo nem ao menos da eficácia imediata da medida.  Pressionadas pela competição estrangeira, as montadoras vinham até  reduzindo preços. Agora vão recuperar a margem de lucro perdida, à custa  do consumidor? Empresas chinesas e coreanas vão continuar sua  estratégia de ganhar clientela com preços artificialmente baixos e,  então, instalar fábricas aqui?
O soluço protecionista do Planalto poderia ter sentido, dada a  excepcional situação da economia mundial. Mas, ao abrir mão de um  programa de aumento da produtividade, o governo brasileiro mostrou mais  uma vez sua pobreza de ideias e sua tendência a aplicar remendos.